
Calle Elisabets, Barcelona. Junho de 2008, fotografia de K.
Tenho sido um viajante incansável, percorrendo as ruas de sombra e poeira dourada do sol. Protegido pelas paredes graníticas das casas antigas, sob o baptismo do novo Verão, partilho este final de tarde com a Dana. Um efémero regresso a Barcelona, a quimera de bocas húmidas que festejassem o desejo que traz o estio. Caminhamos sem dizer uma palavra, ouvindo os ruídos dos viandantes e os passos cálidos do calor que passeia. De vez em quando olhamos um para o outro e sorrimos, e reparo em como é perfeita a sua pele e única a forma sensual da sua boca. Mas todas as bocas me deixaram o sabor amargo do vazio, como se cada uma proclamasse apenas a passagem das estaçőes, como se confessassem ao meu verde olhar que não iria criar raízes. As minhas mãos quiseram por momentos encontrar as suas mãos onde floresciam gestos e sonhos de aventuras distantes, mas depois lembrei-me que aquelas mãos também me deixaram no frio abraço do adeus. Continuamos a caminhar, aproveitando esse seu tempo de amazona que lhe permitira voltar, aquela voz de fada dinarmaquesa, aquele sorriso de miúda travessa. Falamos em inglês, como se o espanhol fosse já uma remota recordação de um tema tabu que não tocamos, e tenho cada vez mais a certeza que a sua vida nas minhas sombras é a resposta que esperava. A despedida é breve e cordial, no fundo sabemos que não queremos mais vazios nos nossos futuros, um deles aquí em Barcelona, o outro no distante Congo. Mesmo antes do crepúsculo, percorro ainda as ruas de sombra e doces mistérios da Barcelona antiga, com o pensamento noutra pessoa, cuja boca nunca beijei mas que faz com que algo dentro de mim se ilumine, e se aclare a côr do meu olhar, e se alargue o horizonte do futuro onde sei que a vou encontrar.