
Jack Kerouac, "On the road"
Barcelona, Julho de 2009. Fotografia de V.B.
“O tempo ri-se de nós, e os anos vão passando”. Ouço as palavras enquanto observo o cabelo encaracolado da Claudia. Os seus olhos azuis acompanham uma nuvem enorme que passeia no céu, além da grande janela, e deixo a sua frase deslizar nos braços do silêncio, ponderando o seu significado. Os anos vão-se, vão-se de nós, sem termos nenhuma hipótese de descobrir os segredos que cintilam nos olhares. O que se oculta atrás de cada rosto, debaixo de cada pele? Deixamo-nos levar pelos sonhos, pelos ecos perenes da esperança, como um longo abraço que alguma vez demos, quando o tempo era uma vaga abstração e a juventude esculpia palavras na nossa alma. Um arrepio percorre o corpo da Claudia, como se adivinhasse os meus pensamentos, e com a mão afaga lentamente a pele mulata do seu braço. Pouso a minha mão sobre o seu ombro. Os anos vão-se de nós, atravessam-nos e deixam pegadas esbatidas no nosso interior. Por vezes, em Domingos silenciosos, em tardes de mansa contemplação, apercebemo-nos disso, na metáfora de uma nuvem que segue o seu caminho, na desilusão que alguém leva no olhar.